A música escuta-se e partilha-se. Esta é uma das regras do bom melómano. Daí que, mais adequado do que fazer uma lista de dez discos destinados a servir de companhia numa ilha deserta, é elaborar uma lista para levar para uma ilha povoada. Aqui ficam, então, as sugestões. Desta feita (gosto deste tique de comentador desportivo), exclusivamente na área da pop e terrenos circundantes. A ordem é aleatória.
1.
The Novelist/Walking Without Effort – Richard Swift
A duração de cada um é curta. Mas certo é que, de uma só penada, Richard Swift editou não apenas um, mas dois discos de estreia. É assim mesmo. Quando se tem na manga tantos truques de primeira qualidade é melhor mostrá-los todos de uma vez, para não deixar dúvidas por desfazer. Para preencher aquilo a que o próprio decidiu chamar o primeiro volume da sua colecção, Swift escolheu perto de dúzia e meia de canções de embalar. Espera-se que os próximos tomos venham a ser tão bons quanto este.
2.Let it Roll – Willard Grant Conspiracy
Ao primeiro contacto com a voz de Robert Fisher, o vocalista da banda, lembrei-me imediatamente do vocalista dos Tindersticks, Stuart Staples.
Let it Roll é o mais recente produto de uma discografia que já leva dez anos de actividade. Só agora dei pela existência deste grupo de Boston, confesso, e ando a tratar de corrigir a falta. Um especialista na matéria disse-me que anda por aí uma colectânea que vale a pena conhecer –
There But For The Grace of God. Para já, voto neste disco. Sem tapar os olhos ou engolir sapos.
3.
The Covers Record – Cat PowerNo arquivo de Abril pode encontrar-se um curto post sobre a mais recente criação de Chan Marshall,
The Greatest. Seria um dos eleitos desta lista, caso não a tivesse limitado a dez presenças e não me tivesse dado já ao trabalho de escrever sobre o CD em causa. Este disco, como o título indica, é de versões. Ouve-se com prazer moderado. Mas atenção: inclui um fantástico
cover de
Satisfaction, dos Rolling Stones. É mesmo a principal razão para que lhe seja colado o selo de “obrigatório”.
4.Aerial – Kate Bush
Perdi o contacto com a pupila de David Guilmour, o guitarrsita dos Pink Floyd que a desencantou quando a rapariga ainda era adolescente, praticamente após a edição de
The Kick Inside, em 1978. Reencontrei-a em
Sensual World, de 1989, e depois voltei a interromper a relação. Não aprecio a pose de pseudo-dançarina, mas acho que este detalhe menos atraente é compensado pelos rasgos de inspiração que, de vez em quando, fazem avançar a sua carreira.
Aerial é um desses momentos em que Kate Bush se superou.
5.Who’s Your New Professor – Sam PrekopO guitarrista dos The Sea and Cake é um homem que gosta de tranquilidade e aprecia pegar nas directivas da bossa-nova a transpô-las para o território da pop. Este é o seu segundo álbum a solo. Com um ou outro sobressalto fugaz, por aqui a palavra de ordem é a de que “não há
stress”. As notas que extrai da sua guitarra são limpinhas, sem sombra de contaminação urbana. Quem dê por bem empregue o seu tempo deve avançar para a obra anterior, que ostenta o nome do músico. Foi o que eu fiz, com bons resultados.
6.The Debt Collection – Shortwave SetEstes loucos – pela positiva – apanharam-me com a canção
Is It Any Wonder e agora não me largam. Não é que me importe. Antes pelo contrário. Samples, alguma electrónica e instrumentos acústicos sobre os quais assentam melodias elegantes são os truques que utilizam, com manifesta habilidade, para hipnotizar quem escuta. É o primeiro disco da banda. E tal como sucede em relação a Richard Swift, espera-se que os próximos tomos da colecção sejam pelos menos tão bons como este.
7.Live At The Fillmore – Lucinda WilliamsSe a questão é apenas ouvir
country não contem comigo. Mas há excepções. Lucinda Williams é um desses casos. Sobretudo se está em causa o duplo-álbum ao vivo. A voz desta figura já consagrada do
country alternativo perde em pureza nas prestações em concerto aquilo que ganha em emotividade. Há muito e bom
rock nestas gravações, o que é um importante ponto a favor. Neil Young é seguramente um referência, quando a guitarra eléctrica fica mais rugosa, mas há outras como os ZZ Top. E não sou eu que o digo. Basta escutar o arranque de
Atonement.
8.
Extraordinary Machine – Fiona Apple
Dei de caras com Fiona Apple, em sentido figurado, evidentemente, quando há uns anos escutei
Limp, do álbum
When The Pawn, numa qualquer estação de rádio que na altura estava sintonizada no carro. Comprei o disco uns tempos depois e demorou algum tempo até começar a gostar de outras faixas que não apenas a que me tinha sido dada como cartão de visita para a obra desta senhora. O mais recente, este
Extraordinary Machine que parece ter passado por diversas e demoradas peripécias durante a produção, é um pico de maturidade numa carreira discográfica que já leva dez anos mas que apenas inclui três CD. É pouco mas é (muito) bom.
9.
Superwolf – Matt Sweeny & Bonnie Prince BillyCom pouco mais do que uma simples Fender Stratocaster, provavelmente aquela a que Bonnie substitui uma corda na fotografia da contracapa, se faz um disco completo, cheio de canções memoráveis.
Superwolf é um álbum intimista que pede silêncio e concentração para ser plenamente desfrutado.
Beast For Thee é um daqueles temas que deve ficar para a vida, mas há muito mais neste disco, em que o equilíbrio geral é simplesmente notável. Fanáticos de produções pomposas e arranjos grandiosos, afastem-se.
10.
The Power Out – ElectrelaneSe me dissessem que esta banda tinha nascido e porfiado no final dos anos 70 quando a vitalidade do
punk e da
new wave se revelou através do aparecimento de centenas de novos nomes, eu até acreditava. Tudo neste disco é tão parecido e, no entanto, tão actual, que não seria necessária uma grande dose de credulidade para cair no engodo. O nome do disco engana. O que não falta aqui é energia para fazer uma festa de arromba. Para momentos mais solenes e formais, aconselha-se o tema
The Valleys.
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