22.6.05

Uma mão cheia de sugestões

Tal como foi anunciado, segue-se uma lista de sugestões de discos que não devem ser dispensados durante o Verão que está a começar.

1. “Fisherman’s Woman”, Emiliana Torrini

A voz sensual e inocente de Emiliana Torrini pode ser escutada no tema final do filme “As Duas Torres”, o segundo episódio da trilogia “O Senhor dos Anéis”. Eu confesso que não me lembro de tal coisa. Mas posso assegurar que a rapariga, de ascendência italiana e islandesa, é um talento que merece ser conhecido. “Fisherman’s Woman” é uma colecção de canções preguiçosas que têm aquele poder de enfeitiçamento que distingue os bons dos maus álbuns. A produção é reduzida ao essencial. E é o que basta. Excelente para escutar ao ar livre, na companhia de um vinho branco leve e de boa qualidade. Um serão perfeito.

2. “Nomad Songs”, Micatone

Não conheço a obra anterior mas já li o suficiente para perceber que esta banda decidiu arrumar (quase toda) a electrónica a um canto com o objectivo de fazer um disco baseado em instrumentos reais. Ainda bem. A voz feminina é óptima, as composições andam entre o “jazz” e o “funky” acústico, a que se soma um pouco de “reggae”. O resultado é perfeito. Aquela caipirinha estupidamente gelada de que se desfruta depois da praia vai saber ainda melhor do que de costume.

3. “Parker’s Mood”, Stefano Di Battista

Um saxofonista de eleição dificilmente faz um álbum mau. Mas quando se trata de homenagear o mestre Charlie Parker, o risco de se tratar de “mais do mesmo” é enorme. Di Battista sai do exame com 20 valores e o mesmo sucede com o pianista e o trompetista que o acompanham nesta gravação (Kenny Barron e Flavio Boltro, respectivamente). A começar pelo clássico “Salt Peanuts”, prosseguindo até “Round Midnight”, “Parker’s Mood” é prazer garantido para o melómano mais exigente. Deve servir-se a seguir ao jantar, quando o Jameson, em balão ou em copo baixo e largo mas com muito gelo, já vem a caminho.

4. “Somewhere Else Is Here”, The Funky Lowlives

Imaginem que os Air voltavam a gravar “Moon Safari” ou que os Zero 7 passavam a ter concorrência apertada. É isso mesmo que este disco dos Funky Lowlives evoca. As canções são “retro”, inspiram-se no psicadelismo dos anos 60 e 70, são cantadas com suavidade e misturam guitarras acústicas com efeitos electrónicos. “Sail Into The Sun” abre o álbum. Nem de propósito. Mais à frente, em “Superlove”, pode encontrar-se a resposta dos Lowlives a “Kelly Watch The Stars”. Um CD para ouvir a partir das primeiras horas depois de se ter acordado. Na praia, no campo ou na montanha.

5. “The Graffiti Artist”, Kid Loco

Quem se recorde de “A Grand Love Story”, certamente terá uma boa impressão de Kid Loco. Neste “The Graffiti Artist”, a capacidade do produtor para hipnotizar as audiências é levada até aos limites. Os sons orientais do sitar fazem muito por isso mas também as intervenções do clarinete contribuem para fornecer uma magia especial à música. É um disco indicado para se ir escutando enquanto se apanha sol e se goza passivamente a paisagem circundante. Para bom entendedor, meia nota basta.

6. “Angel Milk”, Télépopmusik

Este CD tem uma daquelas coisas irritantes que, no entanto, estão muito em voga. Os dois derradeiros temas, se assim se lhes pode chamar, consistem simplesmente em silêncio. Será que John Cage tem uma fiel legião de seguidores da sua peça “4’ 33’’”? Talvez. Mas há outras formas mais criativas de evidenciar a falta de imaginação. De qualquer forma, “Angel Milk” é um disco recheado de boas canções, belas vozes, sobretudo as femininas, que crescem sobre um fundo de electrónica que não anda longe dos primeiros tempos dos Goldfrapp. Depois de Kid Loco, este é capaz de ser o antídoto ideal para uma insolação, a acompanhar um aperitivo na esplanada lá do fundo.

7. “Drill A Hole In That Substrate And Tell Me What You See”, Jim White

Não é novo, eu sei. Mas é um dos discos que me anda a perseguir nos últimos tempos. “Static On The Radio” é uma boa forma de começar a tarde. Uma melodia suave e cativante toma conta dos ouvidos, com a ajuda preciosa de Aimee Man no refrão. JJ Cale e Josh Rouse não andam longe daqui. O melhor está para chegar. Acontece no sarcasmo impiedoso de “If Jesus Drove A Motorhome”, tema que deve ser apreciado quando os sentidos já começaram a recuperar da noitada do dia anterior. Fica bem depois da sandocha que substitui o almoço ou de um mergulho e umas braçadas no mar ou na piscina.

8. “Deep Song”, Kurt Rosenwinkel

Os fanáticos dos cem metros barreiras executados sobre o braço da guitarra devem escolher outras opções mais adequadas. No disco em apreço, Kurt Rosenwinkel mostra, antes do mais, ser capaz de compor excelentes temas e de, nesta ocasião, ter sabido rodear-se de músicos que qualquer um gostaria de ter na sua banda. São os casos do pianista Brad Mehldau ou do saxofonista Joshua Redman. Por vezes, parece que tudo poderá descambar num disco do género “jazz-do-snack-bar-da esquina”. Mas tal nunca acontece. A música é sublime e apazigua o ouvinte após se ter exposto às diabruras de Jim White. Ah, que bela tarde. E nem precisa de ser passada em Itapoã.

9. “The Ground”, Tord Gustavsen Trio

Dos países nórdicos pode esperar-se “jazz” do melhor mas igualmente do mais maçador. De vez em quando dá-lhes para a neura. Deve ser da falta de sol durante os meses em que no hemisfério sul se desfruta da luz do astro-rei. Tord Gustavsen, porém, não tem nada a ver com essa onda. É verdade que a sua música é tranquila mas respira optimismo e bem-estar. Não é um pianista talhado para deslumbrar pela sua capacidade de percorrer as teclas enquanto o diabo esfrega um olho, como sucede com Keith Jarrett. Aqui o campeonato é outro. Trata-se, apenas, de gozar sossegadamente o momento. “Carpe Diem” podia, aliás, ser o título do disco.

10. “La Espada De La Noche”, Ted Nash

Por causa de um álbum anterior deste saxofonista, já estive para desistir de escutar música na minha pobre aparelhagem (ver arquivo do AiFai). Ted Nash regressa com a sua banda Odeon, trazendo o acordeão e a tuba, numa irresistível mistura de timbres. Como aprecia desafios, Nash propõe novas versões de clássicos como “A Night In Tunísia”, em ritmo de tango logo no arranque, assim como uma leitura dos dois primeiros andamentos do “Concerto de Aranjuez”, de Joaquín Rodrgigo, que ninguém no seu perfeito juízo recusará. Se o disco rodar quando o jantar estiver pronto para ser servido, não será má ideia.

E ainda: há que não esquecer as boas colectâneas de “jazz” que o “Público” está a distribuir às quintas-feiras.

Seguir-se-ão outras sugestões. Até porque o AiFai está agora a fazer um ano de actividade, embora nem sempre com a regularidade desejada pelos seus autores. É a vida!

musicaepoucomais@yahoo.com

19.6.05

Dez ou 20 discos para este Verão

Este será o tema do próximo "post". O AiFai segue dentro de momentos.