13.2.05

“Somewhere”, Bill Charlap

Para quem tenha o hábito de, uma vez por outra, fazer uma visita a este blog, a confissão que se segue não terá nada de novo. No que respeita ao jazz, aqui no AiFai existe uma especial predilecção pelo trio de piano. De Sonny Clark a McCoy Tyner, de Red Garland a Brad Mehldau, de Keith Jarrett a Jason Moran, de Bill Evans a Mulgrew Miller, passando por muitos outros magos das teclas que gravam – ou gravaram – discos que se apoiam unicamente na secção rítmica que serve de base de sustentação a qualquer banda clássica, o formato integrado por piano, contrabaixo e bateria é capaz de fazer as delícias dos nossos ouvidos. Daí que cada nova descoberta seja motivo de regozijo.
Foi o caso do mais recente registo em CD do trio liderado por Bill Charlap. Sucessor de “Stardust” no que se refere a edições efectuadas sob o selo da Blue Note, o novo lançamento intitula-se “Somewhere” e é dedicado à música do compositor Leonard Bernstein, responsável por obras como “West Side Story”, circunstância que é evocada no excelente trabalho gráfico que resguarda o disco. O recurso aos “standards” é uma arma de dois gumes. O facto de se tratar de temas que já foram esmiuçados e recriados por centenas de músicos em milhares de discos nem sempre é um factor de entusiasmo. À partida, há que combater o sentimento de que o que se vai escutar é apenas “mais do mesmo”.
Charlap e os seus companheiros, Peter e Kenny Washington (contrabaixista e baterista, respectivamente), contornam o problema. Não é que o pianista, que já tocou com Gerry Mulligan e Phil Woods, se dedique a manobras que o levem muito para fora do “maisnstream” em que se inscreve. Sucede, simplesmente, que Bill Charlap dá boa conta das suas capacidades como instrumentista e revela-se um exímio intérprete, sobretudo em baladas como “Some Other Time” ou “Quiet Girl”. Nos tempos mais acelerados – “Jump” e “Cool” são bons exemplos –, o trio aplica-se no trabalho com energia e os apreciadores da velocidade de execução terão aqui razões para se sentirem satisfeitos. Como se costuma dizer, Charlap tem “swing”. Em caso de dúvida, escute-se “Lucky To Be Me”. Ou "It's Love".

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12.2.05

Josh Rouse e a pop lusitana

Há uns dias trás, um amigo perguntou-me por que seria que as bandas portuguesas de pop e rock são tão desinteressantes. Por que razão incompreensível não haveria músicos no país capazes de comporem e gravarem simples canções, despretensiosas e de acesso imediato, como sucede com numerosos grupos e solistas oriundos de outras paragens. Não lhe soube responder, nem posso garantir, com honestidade, que não haja gente com semelhantes talentos em Portugal.
Pela minha parte, em raras ocasiões na minha vida de melómano me dediquei a conhecer com um mínimo de profundidade o universo da pop nacional. E o que fui conhecendo poucas vezes me entusiasmou. Não sou fã de Abrunhosa, os Clã deixam-me indiferente apesar do evidente empenho e profissionalismo que transparece da sua vocalista, e o deslumbramento que acompanhou a efémera carreira dos Silence 4 passou-me completamente ao lado. Há coisas a que, noutros tempos, achei graça. O “reggae-rock-ska” dos Táxi, os temas dos Jáfumega (desconfio que não é assim que se escreve), os primeiros passos de Rui Veloso através do histórico álbum “Ar de Rock”, os GNR dos anos 80 (“Bellevue” é uma canção fenomenal em qualquer lado do mundo) e as evocações célticas dos Sétima Legião que sempre me pareceu serem compositores que mereciam outro vocalista. Ponto final.
A tal conversa vinha a propósito de Josh Rouse, um cantor-compositor que apenas me decidi a experimentar depois de ter sido incentivado pelo tal amigo que se interrogava, quase filosoficamente, sobre aquilo que parecia considerar ser a inevitável natureza desinspirada das bandas portuguesas. É que, enquanto a conversa decorria, os sons da voz e da guitarra acústica de Rouse iam sendo debitados através das colunas de um computador onde dois discos do intérprete em causa estavam armazenados. As canções tinham sido copiadas para o PC a partir de “1972” e de um CD de “raridades” que é oferecido como bónus a quem adquira o DVD de um registo ao vivo, intitulado “The Smooth Sounds of Josh Rouse”.
De facto, foi-me difícil resistir à enorme capacidade de atracção dos temas que escutei naquela tarde. Gostei da voz de Rouse, fiquei encantado com os arranjos elegantes das diversas faixas e, também, com a notória habilidade do “artista” para criar temas que ficam facilmente no ouvido e nos impelem para a loja mais próxima com o objectivo de comprar algum exemplar da discografia em apreço. Agora, já na posse de “1972” e de “Under Cold Blue Stars”, posso dizer que o meu mergulho na obra de Josh Rouse merece ficar registado, desde já, como um dos bons acontecimentos deste início de 2005. Mesmo que isso me possa valer alguma crítica, potencialmente justa, pelo facto de continuar a interessar-me mais pela boa pop que se faz lá fora, neste caso vinda dos Estados Unidos, do que pelos esforços, eventualmente meritórios, que vão sendo feitos pelos músicos lusitanos neste terreno ferozmente competitivo.

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11.2.05

Tarefas para o fim-de-semana

O computador que está instalado na secretária contígua à que eu ocupo no meu local de trabalho tem o iTunes instalado. Já foi o instrumento de trabalho do proprietário de um iPod e, por esse motivo, tem algumas dezenas de temas armazenados na respectiva memória. A colecção é curta mas de bom gosto, deve assinalar-se. Oscar Peterson, Billie Holiday, Tom Jobim e Bebel Gilberto integram o catálogo de música que sabe bem escutar quando mais uma semana de trabalho se aproxima do seu epílogo e a ânsia pelo fim-de-semana retemperador começa a crescer.
Foi o sopro profundo do saxofone de Ben Webster que, no entanto, me atraiu hoje a atenção. Como o tempo escasseia para ouvir em casa os discos que vou semando um pouco por todo o lado, a sessão que reúne aquele músico com Peterson era coisa de que eu não desfrutava já há algum tempo. Foi, por isso, com grande satisfação que dei por mim a fazer uma pausa para me deixar embalar por aqueles sons quentes e serenos que caracterizam o estilo de Webster. Como talvez fosse inevitável, fiquei com vontade de dedicar os dois próximos dias a um regresso aos CD deste saxofonista. A começar por "Soulville". E assim se arranja, inesperadamente, um agradável programa de fim-de-semana.

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"Long time, no see"

"Espero que o blog não tenha ficado em 'pause' ;-)"

Este é o mais recente comentário de um(a) leitor(a) deixado aqui no AiFai. Bom, de facto este blog tem estado com o botão de "pause" activado. Não porque os seus autores tenham deixado de gostar de música mas simplesmente devido à sobrecarga de afazeres profissionais. Fica a promessa de maior regularidade logo que eu e o paul estejamos menos pressionados pelo cumprimento dos deveres que nos permitem, no fim de cada mês, dispor do precioso dinheiro destinado a ser torrado em CêDês.
De qualquer forma, e como prova de que, ainda assim, a pausa é relativa, aqui fica uma lista dos discos que, nas semanas mais recentes, passaram a figurar na minha colecção:

"Under Cold Blue Stars" - Josh Rouse

"1972" - Josh Rouse

"Requiem" - Branford Marsalis

"Lei It Die" - Feist

"Knuckle Down" - Ani DiFranco

"Superwolf" - Matt Sweeney & Bonnie 'Prince' Charlie

"Greetings From Michigan The Great Lake State" - Sufjan Stevens

"O" - Damien Rice

"L.O.V.E." - Mini Groove Orchestra

"Palookaville" - Fat Boy Slim

"Les Concerts Royaux", de François Couperin - Le Concert Français, Jordi Savall

"'64-'95" - Lemon Jelly

"Welcome To Life" - David Binney

"Tenor Madness" - Sonny Rollins

... e ainda um disco cujo título e intérpretes não consigo descortinar porque o exemplar, pirateado, foi adquirido na cidade de Ouarzazate, em Marrocos, e as inscrições, quer na capa como no CD propriamente dito, estão em árabe... Posso apenas garantir que se trata de um excelente improviso de música berbere.

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